Uma das aprendizagens mais importantes que crianças e adultos podem fazer é a como se sentirem bem e praticarem o bem (feeling good and doing good, Justin Robinson). Esta aprendizagem contribui significativamente para a nossa saúde mental ao longo da vida e pode ocorrer em qualquer contexto de crescimento!
As crianças vivem e interagem em diferentes contextos, ou microssistemas1: a família, a escola, clubes, escoteiros, locais de culto, etc. Cada um destes contextos influencia a forma como a criança se vê a si própria, na relação com os outros e com o mundo e como vai desenvolvendo todas estas relações.
Ora, a partir da idade pré-escolar, a grande maioria das crianças passa a maior parte do seu tempo na escola, sendo este um contexto muito propício à aprendizagem do bem-estar e cidadania. Também o professor é, por excelência, o adulto que, na escola, a criança toma como referência. Como tal, as observações que o professor faz e as suas ações têm um impacto muito grande na forma como as crianças se vêem, quer os professores tenham consciência disso, quer não.
Como podem os professores ajudar as crianças a desenvolver os seus dons e o seu caráter ao mesmo tempo?
Nos últimos nove anos, várias escolas adotaram modelos de Educação Positiva. Na Austrália, os colégios Geelong Grammar School e St. Peter’s College usaram o modelo PERMA2. Este modelo organiza o bem-estar em torno das áreas: emoções positivas, envolvimento, relacionamentos positivos, significado e realização, aos quais geralmente as escolas adicionam uma sexta – a saúde3. Estas escolas repensaram a sua organização em torno deste modelo, reformulando a sua visão da Educação, proporcionando formação a professores e integrando no currículo dos alunos uma disciplina sobre bem-estar.
Os principais resultados da implementação de um modelo de bem-estar nestas duas escolas, mostram4:
- Na Geelong Grammar School (5º ao 10º ano), observou-se uma redução dos níveis de ansiedade e depressão dos alunos e um aumento da auto-eficácia, satisfação com a vida e otimismo.
- No St. Peter’s College (8º ao 11º), observou-se que o envolvimento, a perseverança, o bem-estar geral, a determinação e um sentido de propósito estavam relacionados de forma positiva com os resultados na prova global. Para além disso, os alunos aumentaram o conhecimento e a apreciação das suas forças de caráter e das forças nos colegas. Finalmente, aqueles que mais beneficiaram foram os alunos em maior risco de insucesso escolar.
Em Birmingham, Inglaterra, três escolas implementaram o modelo de Educação para o Caráter, que identifica 4 virtudes principais: Virtudes Intelectuais (e.g., pensamento crítico); Virtudes Morais (e.g., compaixão); Virtudes Cívicas (e.g., cidadania) e Virtudes de Desempenho (e.g., determinação). As quatro contribuem para a Sabedoria Prática, desenvolvida através da experiência e reflexão crítica, que nos permite perceber, conhecer, desejar e agir com bom senso e que contribui para o florescimento dos indivíduos e sociedades. Os resultados preliminares sugerem5:
- Os funcionários reconheceram que são “educadores” de caráter e “modelos”.
- A educação do caráter apoiou o desenvolvimento e a manutenção de relacionamentos positivos dentro e entre as escolas – mas também dependia destes relacionamentos.
- O cultivo da literacia da virtude forneceu um quadro de linguagem compartilhada, necessário para o desenvolvimento do caráter nos funcionários e nos alunos.
- Os alunos das três escolas priorizaram as virtudes morais sobre o desempenho.
No seu conjunto, estes resultados sugerem que o bem-estar e o sucesso académico são complementares e que podem ser suportados através de uma educação positiva.
Por todo o mundo, incluindo em Portugal, o interesse em modelos pedagógicos que incluem o bem-estar e/ou o caráter, está a tomar forma através de medidas preconizadas nos programas de educação dos diferentes países.
Projeto Crescer em Forças 1º ciclo – Semear Valores®
A Semear Valores criou Projeto Crescer em Forças, que tem como objetivo promover o autoconhecimento e a relação positiva entre pares, junto de crianças do 1º ciclo, através do desenvolvimento das suas forças de caráter.
Este projeto está a ser desenvolvido em 6 escolas portuguesas de 1º ciclo, através da formação, acompanhamento e avaliação do trabalho realizado por oito professoras.
Com base nas aprendizagens dos últimos dois anos letivos, reformulámos a nossa intervenção. Assim, o Crescer em Forças começa com a história de “Yuki -um robô com coração: os 7 superpoderes da amizade” e está organizada por níveis, como se de um jogo se tratasse.
Estamos entusiasmadas com a recetividade e dinamismo das professoras, alunos e famílias, que têm colaborado no projeto e esperamos no final deste ano letivo termos uma boa história para partilhar!
Referências bibliográficas
- Bronfenbrenner, U. (1996). A ecologia do desenvolvimento humano: experimentos naturais e planejados. Porto Alegre: Artes Médicas.
- Seligman, M. (2012). A Vida que Floresce. Editora Estrela Polar.
- E.g.: Norrish, J. M., Williams, P., O’Connor, M., & Robinson, J. (2013). An applied framework for positive education. International Journal of Wellbeing, 3(2), 147-161.
- Bott, D., Escamilla, H., Kaufman, S. B., Kern, M. L., Krekel, C., Larson, E.E. (Ed.), SchlichtSchmälzle, R., Seldon, A., Seligman, M., & White, M. (2017). The State of Positive Education: A Review of History, Policy, Practice, and Research. World Government Summit / International Positive Education Network (IPEN).
- The Jubilee Centre for Character and Virtues. (2017a). A Framework for Character Education in Schools.